A arrematação e as dívidas anteriores sobre o imóvel
Entre os tributos relativos ao bem está o Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU)| Foto: Agência Brasil
Em dois julgados paradigmáticos, o Superior Tribunal de Justiça manifestou-se sobre a relevante temática da responsabilidade do arrematante por dívidas anteriores à alienação judicial do imóvel. Nos dois casos, o edital da arrematação previa que o arrematante responderia por dívidas tributárias (IPTU) e por dívidas condominiais anteriores à alienação judicial do imóvel. A questão jurídica reside em saber se as referidas previsões em edital de arrematação são compatíveis com a lei?
Em relação às dívidas tributárias, o Código Tributário Nacional, em seu art. 130, parágrafo único, estabelece que, na alienação judicial de bens imóveis, os tributos relativos ao bem, como o Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU), ficam sub-rogados no preço da arrematação, de modo que os débitos tributários devem ser pagos com o valor obtido no leilão, exonerando o arrematante por tais obrigações. Havia ainda o entendimento de que a cláusula do edital se sobrepunha à regra prevista no CTN, eis que o arrematante aceitava os termos do edital, assumindo voluntariamente tais obrigações.
A 1ª Seção do STJ firmou o precedente vinculante consubstanciado no Tema 1.134, segundo o qual, diante do disposto no art. 130, parágrafo único, do Código Tributário Nacional, é inválida a previsão em edital de leilão atribuindo responsabilidade ao arrematante pelos débitos tributários que já incidiam sobre o imóvel na data de sua alienação. Nos casos de alienação comum, o CTN, em seu art. 130, caput, prevê que o terceiro que adquire bem imóvel passa a ter responsabilidade pelo pagamento dos impostos, taxas ou contribuições de melhorias cujos fatos geradores tenham ocorrido antes da transmissão da propriedade.
Entretanto, o parágrafo único do art. 130 do CTN excepciona a arrematação em hasta pública, hipótese em que a sub-rogação ocorre sobre o respectivo preço. Em relação às dívidas condominiais, vigora o entendimento que tais obrigações têm natureza “propter rem”, isto é, decorre da titularidade da coisa, acompanhando o imóvel em todas as suas mutações subjetivas. Isso porque o Código Civil, em seu art. 1345, estabelece que o adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante em relação ao condomínio.
Em tratamento diametralmente oposto, o Código de Processo Civil, em seu art. 908, §1º, estabelece que, no caso de adjudicação ou alienação, os créditos que recaem sobre o bem, inclusive os de natureza propter rem, sub-rogam-se sobre o respectivo preço. A 3ª Turma do STJ, no REsp 2.042.756, decidiu que o arrematante deve arcar com os débitos condominiais anteriores à arrematação, considerando que o edital informou a existência de tal ônus.
Levou-se em consideração que o edital de arrematação explicitava claramente a existência dos débitos condominiais incidentes sobre o bem imóvel, de sorte que, tendo o imóvel sido alienado em hasta pública com informação no edital da existência de débitos condominiais, responde o arrematante por dívidas condominiais anteriores à arrematação, devido ao caráter “propter rem” da obrigação.
Sendo assim, o adquirente de bem imóvel em hasta pública pode ser chamado a responder pelos débitos condominiais anteriores, se houver advertência expressa nesse sentido no respectivo edital ou se, de outra forma, ele tinha conhecimento do débito. Não obstante a dívida de condomínio seja obrigação “propter rem”, constando do edital da praça previsão expressa isentando o arrematante da responsabilidade por dívidas condominiais anteriores ao ato de arrematação, não é possível exigir desse adquirente de boa-fé o pagamento da respectiva verba (AgInt no REsp 2.042.622, rel. Min. Raul Araújo).
Portanto, infere-se que o arrematante de imóvel em hasta pública não pode responder por dívidas tributárias anteriores à alienação, a teor do Tema 1.134 do STJ, e pode responder por dívidas condominiais, se o edital assim estabelecer ou informar tais obrigações.
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